Filmes e Kubrick. Kubrick e filmes. Entre os dois, filmes e filmes.
Ah, tá certo! Você, meu leitor (que saudade que estava de escrever pra você),
com certeza tem esse caso de amor e ódio com o Stanley (eu apenas não consigo
entender porque sabe?). “Ah, eu amo os filmes dele, mas ODEIO, do fundo do meu
coração, esse tal de 2001: Uma odisseia no espaço!”; “eu não entendo nada desse
filme: Aquilo no começo afinal de contas, eram macacos ou humanos?”; “E aquele
final “tosco”, sem sentido?”. Tá bom! Chega de tanto drama! O filme é uma
ficção, como todo filme, não uma novela, que coisa!
Acho que já deu pra sentir um pouco do “esbravejamento”, vou tentar
amenizar a adrenalina, que tal falarmos "algo que preste" sobre o filme? Vocês me
ajudam com a mesma santa paciência de sempre? Aí vamos nós; que saudade que estava daqui!
Bem, cult. Esse “terminho” chato, que circula por aí com ares de elite,
nada mais é do que “um esbravejo de cultura”. E como todo tipo de cultura, se
destina à determinado público. Você meu caro cinéfilo, não se sinta inferior,
apenas prepare sua pipoca e busque um lugar para poder começar a assistir
filmes. Eles não são medidores de QI, ou de personalidade (eu assisto qualquer
tipo de filme, do mais caro ao “mais B entre os B’s”), mas estão à sua espera, para
o seu entretenimento. Mas, tudo bem, o filme é “cult” (isso é o que os mestres
do cinema dizem) e um pouco complexo, (precisando apenas de um pouco de sua
atenção para uma futura compreensão), e muita gente que assiste fica sem
coragem de dizer que não gostou, ou que não entendeu; alguns outros
reclamam do simples fato da “lentidão” e “extrema chatice” - pobres coitados. Ah,
deixa eu te dizer: não se preocupe, você não está só! 2001: Uma odisseia
no espaço não é um filme pra ser compreendido assistindo apenas uma única
vez. O próprio roteirista do filme (que depois lançara o livro de mesmo nome),
Sir Arthur Clarke afirma a nós, meros mortais: "Se alguém entender 2001 de
primeira, nós teremos falhado. Quisemos levantar muito mais questões do que
respondê-las".
Em sérias palavras agora, esse trabalho sensacional,
magnífico do final dos anos 60, sem dúvida, é um filme autoral; o Stanley não
procurou “agradar”; ele foi além, expressando uma ideia de formas, de ambientes,
entre filosofia e alegorias, nunca antes vista na história do cinema: A arte
visual. Com certeza meu amigo cinéfilo, Stanley Kubrick foi, e continua sendo
um visionário não tenha dúvidas.
"Eu
tentei criar uma experiência visual, que se desviasse do campo das palavras e
penetrasse diretamente no subconsciente com um teor emocional e filosófico...
Projetei o filme para ser uma experiência subjetiva intensa, que atinja o
espectador num nível profundo de consciência, exatamente como a música faz...
Você está livre para especular como quiser sobre o sentido filosófico e
alegórico do filme."
Stanley
Kubrick
Bem,
pra te “ajudar” um pouco na compreensão desse filme, e fazê-lo viajar um pouco
pelo espaço através dessa obra cinematográfica, escrevi umas besteiras, baseadas
em algumas opiniões de diferentes críticos de cinema, que curiosamente “colhi”
na internet; dividi o filme em sessões, para tornar mais simples a compreensão
e pra você não precisar ler tudo, apenas o que te interessa – estou “me achando”.
Portanto, se você ficou curioso para assistir ao filme, e não é daqueles que gosta de não ter novidades sobre o que vai acontecer, SERIA BOM QUE DEIXASSE PARA LER DEPOIS. Sem mais delongas, vamos ao que interessa: Primeiramente, com a palavra, Kubrick:
"Alguém
disse que o Homem atual é o elo perdido entre os macacos e o Homem civilizado.
Pode-se dizer que essa é a história de 2001, também. Nós somos
semi-civilizados, capazes de cooperação e afeição, mas precisando de alguma
forma de transfiguração em uma forma de vida mais elevada. Agora que alcançamos
o poder de exterminar toda a vida na Terra, será preciso mais do que cooperação
e planejamento pra evitar alguma catástrofe. O problema existe enquanto o
potencial existe; e o problema é essencialmente moral e espiritual."
Stanley
Kubrick
ABERTURA
Logo de início, “bem de cara”, nos encontramos com um belo alinhamento
do Sol, da Lua e da Terra. Magistralmente, sem computação gráfica e sem George
Lucas para salvar a galáxia, esse tal alinhamento se repete algumas vezes que um
monolito surge. O Sol ganha um destaque especial durante todo o filme, uma vez
que simboliza uma idéia de "renascimento" (que é um tema recorrente
no filme) nas mais diversas culturas, e por conta disso não é forçoso dizer que
há oculto (de cabeça-pra-baixo) na imagem-título do filme uma insinuação a um
ícone pagão, o símbolo do Deus Cornífero da Wicca que, não por acaso,
simboliza a morte e renascimento, e que em seu aspecto celeste é representado
pelo Sol.
A
AURORA DO HOMEM
O nome em inglês é The Dawn of Man, que tanto pode ser
traduzido tanto como "o surgimento do homem" quanto como "o
amanhecer da humanidade" – numa linguagem mais poética. Nas primeiras
cenas, vemos o nascimento e ascensão do Sol durante a pré-história. O futuro
ser humano nada mais é do que um descendente do macaco (entendeu agora?),
herbívoro e vulnerável aos perigos do habitat selvagem. Há uma cena de conflito
entre dois grupos de seres humanos por um poço de água; percebe-se que um grupo
é mais inteligente que o outro, “ficando no grito” com o bem mineral. O grupo
perdedor se refugia num buraco durante a noite. Ao amanhecer do dia, os
perdedores veem um monolito negro, enquanto que os vencedores o tocam/admiram.
Novamente se vê a imagem do alinhamento do monolito com o Sol e a Lua – que
poderia nos remeter novamente ao símbolo Wicca, mas com o Sol pela metade e
ainda distante da Lua. Numa das cenas mais marcantes do cinema, o (homem) macaco
descobre o poder da ferramenta – o osso. Interessante é que o próprio usa a
ferramenta pra matar. Antes se alimentara, depois percebeu a importância para o
manuseio de recursos naturais. Durante o confronto com o grupo rival, o humano
inimigo é morto com toques de sadismo. Ao usar o osso como ferramenta pra
matar, pode-se perceber o sentimento de consciência de poder, força e domínio, os
quais combinados com a intimidação caracterizam o macho-alfa até hoje; estava
aí o protótipo do ser humano. Logo, não fosse por ele, não existiríamos como
espécie – influência do darwinismo. De repente, somos levados ao maior corte da
história do cinema de maneira tão tranquila, tão singela, tão eufêmica, isso
porque a história avança milhões de anos em um único segundo (é magnífico!),
com a câmera acompanhando o movimento circular daquele osso no céu, que se dá
lugar à: UMA NAVE FLUTUANDO NO ESPAÇO, resumindo brilhantemente toda a
história da humanidade – sensacional, não acham?
A
ESTAÇÃO ESPACIAL
Já pode-se ver e crer, em 1968 (ano de produção do filme), a ideia de
globalização, oficialmente pronunciada no final dos anos 80, onde os países
estão integrados na exploração espacial, com naves de várias nacionalidades – vê-se
as bandeiras alemã e chinesa em duas delas. A caneta flutuando na
gravidade zero, remetendo inconscientemente ao osso flutuando no ar, e a
lembrança de que agora "a caneta é mais forte que a espada". A força
bruta antes utilizada não é mais necessária, dando lugar à diplomacia, que se
traduz aparentemente em “amistosas conversas com os russos dentro da estação” –
como é uma produção americana, não vou lhe dizer o que acontecia entre os dois
países nessa época. Mas logo percebemos que o cientista Heywood Floyd esconde
um segredo, do qual os russos desconfiam e mal conseguem esconder sua curio/animosidade.
Alguns cineastas apontam tal cena como uma reprise "versão guerra
fria" da briga pré-histórica pelo poço d'água – tá certo, coincidência ou
não, os participantes conversam ao redor de uma mesa circular com copos d'água,
viu?
NA
LUA
Ora, descobre-se que um objeto fora enterrado deliberadamente na Lua há
4 milhões de anos – quem sabe se não no lado oculto do corpo celeste? Por quem,
nunca se sabe (ops: soube, não é?). Ah, era o monolito negro, o mesmo que
aparecera para os macacos na pré-história. Em outra cena fantástica, Floyd toca
o monolito com a mesma admiração que seu antepassado. Através do livro de
Arthur Clarke se tem uma explicação mais detalhada para o que acontece em
seguida: a luz do Sol toca o monolito pela primeira vez (ele foi escavado
durante os 14 dias de noite lunar), e então ele emite um poderoso sinal de
rádio, que interfere com os comunicadores dos astronautas, provocando um
zumbido intermitente. Verifica-se também o mesmo alinhamento da pré-história,
agora com a meia-lua (desta vez representada pela Terra) mais próxima do Sol.
MISSÃO
JÚPITER: 18 MESES DEPOIS
Agora na nave Discovery 1, rumando para Júpiter, em busca do destino do
sinal de rádio, vê-se o astronauta Frank Poole correndo em círculos, no que
parece uma versão gigante e futurista de uma roda para aquele lindo ratinho que
você talvez crie. De fato, os humanos na nave são meros
passageiros/prisioneiros, pois quem controla tudo na verdade é (suspense!) o
computador HAL 9000, mostrando desde aquela época, a já dependência tecnológica
por parte dos humanos. A sigla HAL é uma "homenagem" (na verdade uma
crítica) à empresa de computadores IBM – se você gosta de teorias conspiratórias,
conspire comigo agora: mova cada letra da sigla IBM uma posição no alfabeto pra
trás, e você terá... HAL! . Na época em que o filme fora produzido, a IBM era
mais poderosa e influente empresa no ramo de desenvolvimento de softwares e
informação.
Mas, e o HAL? Ah, o HAL é um dos símbolos que remetem ao livro "A
odisséia", de Homero – além, claro, do próprio título do filme. Para ser
mais específico, HAL é uma alusão ao ciclope, um dos adversários de Ulisses na lenda
– agora sim, será que foi lenda? É algo notável que o computador HAL
demonstre no filme mais emoções do que os próprios tripulantes. Enquanto os
astronautas ficam apáticos a maior parte do tempo, HAL traz em sua monótona
fala certo orgulho de ser infalível (e mais adiante medo e ansiedade por ser
desligado). Isso aparenta ser uma crítica velada ao aprisionamento do homem às
condições impostas pelas máquinas, e a perda da humanidade decorrente disso.
Poderíamos culpar os atores, ou até mesmo o diretor (que crime!) por
essa falta de emoção dos personagens, mas o fato é que essa aparente falta de
vitalidade encaixa sutilmente no contexto do filme. Você percebeu que no início
os atores vestidos de macaco são muito mais expressivos do que os atores
"humanos"? Isso porque no futuro o ser humano
está engessado pela tecnologia em um ambiente séptico, sem cor,
sem arte. Isso é reforçado pelos “diálogos bobos” e aparentemente inúteis.
Apenas numa examinada atenta (e posterior) pode-se extrair o que Kubrick queria
passar com eles: no diálogo de Heywood Floyd com sua filha percebe-se que a mãe
não está em casa, e o pai se desculpa por não poder ir ao aniversário da garotinha.
Na conversa com os russos mais uma vez vemos a separação familiar, com a russa
no espaço e o marido na Terra, trabalhando no fundo do mar (ambos isolados de
seu habitat original!). E, dentro da Discovery, o astronauta Frank Poole recebe
pelo videofone os parabéns dos familiares sem esboçar a menor reação, numa
transmissão pré-gravada, onde a comunicação está cada vez mais comprometida por
conta das imensas distâncias. O aniversário é normalmente um tempo de celebrar
o próprio nascimento, a alegria da vida. É também uma ocasião para introspecção
e reavaliação, numa espécie de renascimento: não importa como as coisas foram
ontem ou no ano passado, nós sempre temos a capacidade de tentar de novo.
Assim, a incapacidade de celebrar apropriadamente os aniversários pode refletir
no filme a incapacidade do homem de se repensar (e se recriar) como dono da sua
própria vida.
Durante a viagem, o computador acusa uma falha na unidade de
comunicação. Ao averiguar a falha, percebe-se que a unidade estava funcionando
bem, o que significa que o computador HAL aparentemente está com alguma falha.
Os tripulantes cogitam desativar o próprio. Para se proteger (e, na lógica
dele, proteger a missão) HAL MATA a maioria dos tripulantes. Entretanto, o
astronauta David Bowman (Dave) consegue desligá-lo. Bem, esse é um resumo
rápido da história. Agora vamos à análise desta parte do filme: muitos
interpretam o comportamento de HAL como uma falha (causada não se sabe porque,
talvez pela influência do monolito? me ajudem a solucionar esse mistério!), mas
há pistas que indicam que HAL poderia estar jogando com os astronautas da mesma
forma que ele aparece jogando xadrez, e esta é uma cena reveladora. Kubrick amava
xadrez, e colocou HAL jogando com o astronauta Poole uma partida que realmente
aconteceu em 1910, entre Roesch e Willi Schlage. Acontece que HAL faz o
movimento correto, mas diz de forma errada: "Rainha para bispo 3",
quando o correto seria "Rainha para bispo 6". Um erro bobo de um
computador pirado, um deslize de Kubrick ou um teste sutil de HAL pra ver se
Poole perceberia? A ideia do teste é importante porque é verbalizada e
confirmada pelo HAL na próxima cena, onde ele pergunta (como quem não quer
nada) a David sobre os rumores circundando a missão, e o que ele achava disso.
Só que David desconfia e responde com outra pergunta: "isso faz parte do
nosso teste psicológico, não é?". Ao que HAL confirma, tira por menos
("é uma coisa boba"), dá aquela "travadinha" e depois acusa
o tal erro na unidade de comunicação. Seria erro, ou apenas (mais um) outro
teste? É importante lembrar que, após o desligamento de HAL, uma mensagem em
vídeo pré-gravada dizia que o computador só tomou conhecimento dos parâmetros
da missão no meio da viagem, pra depois informá-la aos tripulantes quando estes
chegassem a Júpiter. Então essa mudança de comportamento de HAL pode muito bem
ter sido uma reação ao conhecimento da relevância da missão, e que os
astronautas precisariam estar à altura dela, ou não poderia?
A desativação de HAL é, sem dúvida, o momento mais marcante do filme.
Quando ele pede por sua "vida" e começa a cantar dá uma inversão de
sentimentos e valores que é perturbadora (afinal, ele é o vilão da trama!); o
computador volta ao momento do nascimento (novamente o tema
"renascimento") e repete o que disse na sua primeira apresentação.
Aliás, pra quem tinha dúvida de que a sigla não é apenas uma coincidência com a
IBM, HAL diz nessa cena que foi construído em Urbana Illinois e instruído pelo
Sr. Langley, e então canta a música Daisy Bell. Os da informática sabem muito
bem que o primeiro computador a ter sintetizador de voz foi o modelo IBM
704, construído em 1962, no centro de pesquisa Langley, em Urbana Illinois – ou
você acha que eu iria esquecer isso? E a primeira música que ele cantou numa
demonstração (advinha qual foi? com Certeza!) foi Daisy Bell, e Arthur Clarke
estava lá pra ver e ouvir isso – pronto, matei a charada.
Uma coisa que só se percebe no inglês é o uso recorrente por HAL do
termo “I'm afraid” (estou com medo). Num uso ultra polido, este termo é
entendido como “Receio que”, pra negar alguma coisa a alguém polidamente (“I'm
afraid I can't do that" – “Receio que não possa fazer isso”). Mas, ao ser
desativado, HAL usa esse termo indicando medo, de fato. E Kubrick pareceu
querer reforçar isso pelo uso sistemático desse termo, inclusive por David,
quando cogitam desliga-lo. Foi por medo de comprometer a missão que HAL matou a
tripulação? Teria sido por medo de admitir sua própria falha que a máquina
escondeu que errou ao informar o defeito? Não foi por medo que os astronautas
quiseram desligar HAL? Enfim, esse é apenas mais um nível em que o filme pode
ser analisado.
JÚPITER
E ALÉM
Mais uma vez os corpos celestes se alinham. E mais uma vez a
lembrança do símbolo do Deus cornífero. Essa é a parte mais louca e
incompreensível do filme, em que David deixa a Discovery em uma cápsula e
embarca rumo a uma viagem intergaláctica até sabe-se lá onde! Os comentários
mais interessantes são os de que as imagens surreais que inundam a tela fazem
referência (num nível subconsciente) a criação da vida no útero – tá, eu sei
que foram longe. Se formos analisar Freud, a nave Discovery (um grande falo)
ejeta pela "cabeça" a cápsula de uma forma diferente das demais, como
se tivesse cuspindo-a (ou ejaculando-a, ah, você entendeu). Entra-se então por
uma fenda vertical (sim) e, dentre as várias imagens fluidas que também lembram
galáxias sendo criadas, há pelo menos duas que não precisam de muita imaginação
para possíveis interpretações. Ao fim da sucessão de imagens aquosas e
orgânicas, aparecem 7 objetos lapidados em forma de Octaedros (um dos
sólidos platônicos relacionados ao ar). Seriam estas naves extraterrestres,
escoltando David através de um portal? Seja como for, elas encerram a parte da
viagem através das luzes. A viagem continua por uma superfície rochosa,
entrecortada por rios e mares, até que David chega a uma sala totalmente
decorada com mobília da era da renascença (renascimento de novo!) e quadros com
cenas bucólicas da natureza. Apenas o chão retro iluminado (semelhante ao teto
da estação espacial) alude a uma época futurista. Em cenas que alternam
pontos de vista, David vê a si mesmo como outra pessoa, progressivamente mais
velho. Pode-se interpretar essa sequência no quarto como uma desintoxicação da
dependência das máquinas, uma vez que ele se desfaz da roupa de astronauta; e poder-se-ia
inclusive retomar a ideia do capacete verde, visto que a mesa é verde (ora
bolas!), e, na cena do leito de morte, aparece um largo espaldar verde circundando
a área da cabeça de David. Quando ele quebra a taça de vinho é que atinge
um nível de consciência mais elevado. Na tradição judaica, quebra-se
um cálice ao fim da cerimônia de casamento. Há vários significados, mas um
deles é que isso simboliza uma nova vida, um mudança de forma para todo o
sempre, ou seja, e dois indivíduos passam a ser um casal.
Da cama, David vê o monolito, e faz um gesto de tocá-lo que
lembra muito a pintura "A Criação de Adão", que o
mestre renascentista (renascimento) Michelangelo fez no teto da Capela
Sistina – você sabe onde
fica. David transforma-se
então num feto, com um brilho no olhar (torna-se um iluminado?). A câmera se
aproxima do monolito, como se fôssemos transportados do local para a
escuridão do espaço, de onde o feto (já leu algo sobre “Starchild”, aquela
história da carochinha sobre crianças de outros planetas?) contempla o planeta
Terra do alto, para depois mirar bem dentro de nossos olhos com um olhar
perturbador que mescla sabedoria/velhice e inocência/infância, o que me remete
a ideia que os seres humanos sempre irão influenciar de um jeito ou de outro,
as gerações seguintes.
Kubrick não quis limitar o escopo de seu filme.
"Como poderíamos apreciar a Mona Lisa se Leonardo da
Vinci tivesse escrito embaixo do quadro: ‘A mulher está sorrindo porque ela
esconde um segredo do seu amado'. Isso iria acorrentar o espectador à realidade,
e eu não quero que isso aconteça com 2001. Eu trabalhei de forma que nada
importante é dito nos diálogos, e que qualquer coisa importante no filme seja
traduzida em termos de ação. Um roteiro é a forma de escrita menos comunicativa
já feita”
Stanley Kubrick
Mas quem expressou melhor a relação com o filme foi o ator Keir Dullea, que
interpretou o David Bowman.
"Se você vê um quadro de Picasso, é importante saber
o que Picasso queria ou é mais importante sua relação com ele, sua reação
emocional a ele?"
David Bowman
Não é lindo? Pode ser até mais
um “nada a ver”, mas olha que faz um sentindo... daqueles que aguça todos os
outros, viu? Que é complicado de se assistir e de se entender (só nas duas primeiras vezes certo?) é, mas... depois da primeira tentativa tudo se resolve. Interessante quando assisti a esse filme pela primeira vez:
01 de janeiro de 2000, em plena madrugada; todo mundo dizia: “Ah, o mundo vai
acabar”, “Será o fim da humanidade”, só porque era transição milenar. A humanidade
não tem fim. O fim não conhece o fim, e se conhece, creio que nem mesmo o próprio venha a lembrar-se. O mesmo se dá com o início. Esse filme
é um espetáculo, talvez de uma futura realidade, não muito distante da nossa. É
um filme revolucionário. Afinal de contas, você está acessando esse registro
virtual através de que máquina? Seria ela um IBM Sequoia... ou Tablet Phone?
Ah, você não está na terra? Tá certo. Você não sente nada ao ouvir o prelúdio e encerramento do filme?
2001:
A Space Odissey, EUA, 1968, 142 min. Colorido. Distribuido pela Warner Bros.
Com Keir Dullea, Gary Lockwood, William Sylvester, Douglas Rain.
Escrito,
Produzido e Dirigido por Stanley Kubrick.
Orçamento: U$$ 10,5 milhões. Receita nos EUA: U$$ 56,71 milhões.
Por Dandan
Gouveia, da série “um pouco de Kubrick”. Aguardem pelos próximos.