sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Um pouco de Kubrick: 2001: Uma Odisseia no Espaço

Filmes e Kubrick. Kubrick e filmes. Entre os dois, filmes e filmes. Ah, tá certo! Você, meu leitor (que saudade que estava de escrever pra você), com certeza tem esse caso de amor e ódio com o Stanley (eu apenas não consigo entender porque sabe?). “Ah, eu amo os filmes dele, mas ODEIO, do fundo do meu coração, esse tal de 2001: Uma odisseia no espaço!”; “eu não entendo nada desse filme: Aquilo no começo afinal de contas, eram macacos ou humanos?”; “E aquele final “tosco”, sem sentido?”. Tá bom! Chega de tanto drama! O filme é uma ficção, como todo filme, não uma novela, que coisa!
Acho que já deu pra sentir um pouco do “esbravejamento”, vou tentar amenizar a adrenalina, que tal falarmos "algo que preste" sobre o filme? Vocês me ajudam com a mesma santa paciência de sempre? Aí vamos nós; que saudade que estava daqui!

Bem, cult. Esse “terminho” chato, que circula por aí com ares de elite, nada mais é do que “um esbravejo de cultura”. E como todo tipo de cultura, se destina à determinado público. Você meu caro cinéfilo, não se sinta inferior, apenas prepare sua pipoca e busque um lugar para poder começar a assistir filmes. Eles não são medidores de QI, ou de personalidade (eu assisto qualquer tipo de filme, do mais caro ao “mais B entre os B’s”), mas estão à sua espera, para o seu entretenimento. Mas, tudo bem, o filme é “cult” (isso é o que os mestres do cinema dizem) e um pouco complexo, (precisando apenas de um pouco de sua atenção para uma futura compreensão), e muita gente que assiste fica sem coragem de dizer que não gostou, ou que não entendeu; alguns outros reclamam do simples fato da “lentidão” e “extrema chatice” - pobres coitados. Ah, deixa eu te dizer: não se preocupe, você não está só! 2001: Uma odisseia no espaço não é um filme pra ser compreendido assistindo apenas uma única vez. O próprio roteirista do filme (que depois lançara o livro de mesmo nome), Sir Arthur Clarke afirma a nós, meros mortais: "Se alguém entender 2001 de primeira, nós teremos falhado. Quisemos levantar muito mais questões do que respondê-las". 

Em sérias palavras agora, esse trabalho sensacional, magnífico do final dos anos 60, sem dúvida, é um filme autoral; o Stanley não procurou “agradar”; ele foi além, expressando uma ideia de formas, de ambientes, entre filosofia e alegorias, nunca antes vista na história do cinema: A arte visual. Com certeza meu amigo cinéfilo, Stanley Kubrick foi, e continua sendo um visionário não tenha dúvidas.

"Eu tentei criar uma experiência visual, que se desviasse do campo das palavras e penetrasse diretamente no subconsciente com um teor emocional e filosófico... Projetei o filme para ser uma experiência subjetiva intensa, que atinja o espectador num nível profundo de consciência, exatamente como a música faz... Você está livre para especular como quiser sobre o sentido filosófico e alegórico do filme."
Stanley Kubrick

       Bem, pra te “ajudar” um pouco na compreensão desse filme, e fazê-lo viajar um pouco pelo espaço através dessa obra cinematográfica, escrevi umas besteiras, baseadas em algumas opiniões de diferentes críticos de cinema, que curiosamente “colhi” na internet; dividi o filme em sessões, para tornar mais simples a compreensão e pra você não precisar ler tudo, apenas o que te interessa – estou “me achando”. Portanto, se você ficou curioso para assistir ao filme, e não é daqueles que gosta de não ter novidades sobre o que vai acontecer, SERIA BOM QUE DEIXASSE PARA LER DEPOIS. Sem mais delongas, vamos ao que interessa: Primeiramente, com a palavra, Kubrick:

"Alguém disse que o Homem atual é o elo perdido entre os macacos e o Homem civilizado. Pode-se dizer que essa é a história de 2001, também. Nós somos semi-civilizados, capazes de cooperação e afeição, mas precisando de alguma forma de transfiguração em uma forma de vida mais elevada. Agora que alcançamos o poder de exterminar toda a vida na Terra, será preciso mais do que cooperação e planejamento pra evitar alguma catástrofe. O problema existe enquanto o potencial existe; e o problema é essencialmente moral e espiritual." 
Stanley Kubrick

ABERTURA
Logo de início, “bem de cara”, nos encontramos com um belo alinhamento do Sol, da Lua e da Terra. Magistralmente, sem computação gráfica e sem George Lucas para salvar a galáxia, esse tal alinhamento se repete algumas vezes que um monolito surge. O Sol ganha um destaque especial durante todo o filme, uma vez que simboliza uma idéia de "renascimento" (que é um tema recorrente no filme) nas mais diversas culturas, e por conta disso não é forçoso dizer que há oculto (de cabeça-pra-baixo) na imagem-título do filme uma insinuação a um ícone pagão, o símbolo do Deus Cornífero da Wicca que, não por acaso, simboliza a morte e renascimento, e que em seu aspecto celeste é representado pelo Sol.

A AURORA DO HOMEM
       
O nome em inglês é The Dawn of Man, que tanto pode ser traduzido tanto como "o surgimento do homem" quanto como "o amanhecer da humanidade" – numa linguagem mais poética. Nas primeiras cenas, vemos o nascimento e ascensão do Sol durante a pré-história. O futuro ser humano nada mais é do que um descendente do macaco (entendeu agora?), herbívoro e vulnerável aos perigos do habitat selvagem. Há uma cena de conflito entre dois grupos de seres humanos por um poço de água; percebe-se que um grupo é mais inteligente que o outro, “ficando no grito” com o bem mineral. O grupo perdedor se refugia num buraco durante a noite. Ao amanhecer do dia, os perdedores veem um monolito negro, enquanto que os vencedores o tocam/admiram. Novamente se vê a imagem do alinhamento do monolito com o Sol e a Lua – que poderia nos remeter novamente ao símbolo Wicca, mas com o Sol pela metade e ainda distante da Lua. Numa das cenas mais marcantes do cinema, o (homem) macaco descobre o poder da ferramenta – o osso. Interessante é que o próprio usa a ferramenta pra matar. Antes se alimentara, depois percebeu a importância para o manuseio de recursos naturais. Durante o confronto com o grupo rival, o humano inimigo é morto com toques de sadismo. Ao usar o osso como ferramenta pra matar, pode-se perceber o sentimento de consciência de poder, força e domínio, os quais combinados com a intimidação caracterizam o macho-alfa até hoje; estava aí o protótipo do ser humano. Logo, não fosse por ele, não existiríamos como espécie – influência do darwinismo. De repente, somos levados ao maior corte da história do cinema de maneira tão tranquila, tão singela, tão eufêmica, isso porque a história avança milhões de anos em um único segundo (é magnífico!), com a câmera acompanhando o movimento circular daquele osso no céu, que se dá lugar à: UMA NAVE FLUTUANDO NO ESPAÇO, resumindo brilhantemente toda a história da humanidade – sensacional, não acham?


A ESTAÇÃO ESPACIAL

Já pode-se ver e crer, em 1968 (ano de produção do filme), a ideia de globalização, oficialmente pronunciada no final dos anos 80, onde os países estão integrados na exploração espacial, com naves de várias nacionalidades – vê-se as bandeiras alemã e chinesa em duas delas. A caneta flutuando na gravidade zero, remetendo inconscientemente ao osso flutuando no ar, e a lembrança de que agora "a caneta é mais forte que a espada". A força bruta antes utilizada não é mais necessária, dando lugar à diplomacia, que se traduz aparentemente em “amistosas conversas com os russos dentro da estação” – como é uma produção americana, não vou lhe dizer o que acontecia entre os dois países nessa época. Mas logo percebemos que o cientista Heywood Floyd esconde um segredo, do qual os russos desconfiam e mal conseguem esconder sua curio/animosidade. Alguns cineastas apontam tal cena como uma reprise "versão guerra fria" da briga pré-histórica pelo poço d'água – tá certo, coincidência ou não, os participantes conversam ao redor de uma mesa circular com copos d'água, viu?

NA LUA

Ora, descobre-se que um objeto fora enterrado deliberadamente na Lua há 4 milhões de anos – quem sabe se não no lado oculto do corpo celeste? Por quem, nunca se sabe (ops: soube, não é?). Ah, era o monolito negro, o mesmo que aparecera para os macacos na pré-história. Em outra cena fantástica, Floyd toca o monolito com a mesma admiração que seu antepassado. Através do livro de Arthur Clarke se tem uma explicação mais detalhada para o que acontece em seguida: a luz do Sol toca o monolito pela primeira vez (ele foi escavado durante os 14 dias de noite lunar), e então ele emite um poderoso sinal de rádio, que interfere com os comunicadores dos astronautas, provocando um zumbido intermitente. Verifica-se também o mesmo alinhamento da pré-história, agora com a meia-lua (desta vez representada pela Terra) mais próxima do Sol.

MISSÃO JÚPITER: 18 MESES DEPOIS

Agora na nave Discovery 1, rumando para Júpiter, em busca do destino do sinal de rádio, vê-se o astronauta Frank Poole correndo em círculos, no que parece uma versão gigante e futurista de uma roda para aquele lindo ratinho que você talvez crie. De fato, os humanos na nave são meros passageiros/prisioneiros, pois quem controla tudo na verdade é (suspense!) o computador HAL 9000, mostrando desde aquela época, a já dependência tecnológica por parte dos humanos. A sigla HAL é uma "homenagem" (na verdade uma crítica) à empresa de computadores IBM –  se você gosta de teorias conspiratórias, conspire comigo agora: mova cada letra da sigla IBM uma posição no alfabeto pra trás, e você terá... HAL! . Na época em que o filme fora produzido, a IBM era mais poderosa e influente empresa no ramo de desenvolvimento de softwares e informação.
Mas, e o HAL? Ah, o HAL é um dos símbolos que remetem ao livro "A odisséia", de Homero – além, claro, do próprio título do filme. Para ser mais específico, HAL é uma alusão ao ciclope, um dos adversários de Ulisses na lenda – agora sim, será que foi lenda? É algo notável que o computador HAL demonstre no filme mais emoções do que os próprios tripulantes. Enquanto os astronautas ficam apáticos a maior parte do tempo, HAL traz em sua monótona fala certo orgulho de ser infalível (e mais adiante medo e ansiedade por ser desligado). Isso aparenta ser uma crítica velada ao aprisionamento do homem às condições impostas pelas máquinas, e a perda da humanidade decorrente disso. Poderíamos culpar os atores, ou até mesmo o diretor (que crime!) por essa falta de emoção dos personagens, mas o fato é que essa aparente falta de vitalidade encaixa sutilmente no contexto do filme. Você percebeu que no início os atores vestidos de macaco são muito mais expressivos do que os atores "humanos"? Isso porque no futuro o ser humano está engessado pela tecnologia em um ambiente séptico, sem cor, sem arte. Isso é reforçado pelos “diálogos bobos” e aparentemente inúteis. Apenas numa examinada atenta (e posterior) pode-se extrair o que Kubrick queria passar com eles: no diálogo de Heywood Floyd com sua filha percebe-se que a mãe não está em casa, e o pai se desculpa por não poder ir ao aniversário da garotinha. Na conversa com os russos mais uma vez vemos a separação familiar, com a russa no espaço e o marido na Terra, trabalhando no fundo do mar (ambos isolados de seu habitat original!). E, dentro da Discovery, o astronauta Frank Poole recebe pelo videofone os parabéns dos familiares sem esboçar a menor reação, numa transmissão pré-gravada, onde a comunicação está cada vez mais comprometida por conta das imensas distâncias. O aniversário é normalmente um tempo de celebrar o próprio nascimento, a alegria da vida. É também uma ocasião para introspecção e reavaliação, numa espécie de renascimento: não importa como as coisas foram ontem ou no ano passado, nós sempre temos a capacidade de tentar de novo. Assim, a incapacidade de celebrar apropriadamente os aniversários pode refletir no filme a incapacidade do homem de se repensar (e se recriar) como dono da sua própria vida.
Durante a viagem, o computador acusa uma falha na unidade de comunicação. Ao averiguar a falha, percebe-se que a unidade estava funcionando bem, o que significa que o computador HAL aparentemente está com alguma falha. Os tripulantes cogitam desativar o próprio. Para se proteger (e, na lógica dele, proteger a missão) HAL MATA a maioria dos tripulantes. Entretanto, o astronauta David Bowman (Dave) consegue desligá-lo. Bem, esse é um resumo rápido da história. Agora vamos à análise desta parte do filme: muitos interpretam o comportamento de HAL como uma falha (causada não se sabe porque, talvez pela influência do monolito? me ajudem a solucionar esse mistério!), mas há pistas que indicam que HAL poderia estar jogando com os astronautas da mesma forma que ele aparece jogando xadrez, e esta é uma cena reveladora. Kubrick amava xadrez, e colocou HAL jogando com o astronauta Poole uma partida que realmente aconteceu em 1910, entre Roesch e Willi Schlage. Acontece que HAL faz o movimento correto, mas diz de forma errada: "Rainha para bispo 3", quando o correto seria "Rainha para bispo 6". Um erro bobo de um computador pirado, um deslize de Kubrick ou um teste sutil de HAL pra ver se Poole perceberia? A ideia do teste é importante porque é verbalizada e confirmada pelo HAL na próxima cena, onde ele pergunta (como quem não quer nada) a David sobre os rumores circundando a missão, e o que ele achava disso. Só que David desconfia e responde com outra pergunta: "isso faz parte do nosso teste psicológico, não é?". Ao que HAL confirma, tira por menos ("é uma coisa boba"), dá aquela "travadinha" e depois acusa o tal erro na unidade de comunicação. Seria erro, ou apenas (mais um) outro teste? É importante lembrar que, após o desligamento de HAL, uma mensagem em vídeo pré-gravada dizia que o computador só tomou conhecimento dos parâmetros da missão no meio da viagem, pra depois informá-la aos tripulantes quando estes chegassem a Júpiter. Então essa mudança de comportamento de HAL pode muito bem ter sido uma reação ao conhecimento da relevância da missão, e que os astronautas precisariam estar à altura dela, ou não poderia?
A desativação de HAL é, sem dúvida, o momento mais marcante do filme. Quando ele pede por sua "vida" e começa a cantar dá uma inversão de sentimentos e valores que é perturbadora (afinal, ele é o vilão da trama!); o computador volta ao momento do nascimento (novamente o tema "renascimento") e repete o que disse na sua primeira apresentação. Aliás, pra quem tinha dúvida de que a sigla não é apenas uma coincidência com a IBM, HAL diz nessa cena que foi construído em Urbana Illinois e instruído pelo Sr. Langley, e então canta a música Daisy Bell. Os da informática sabem muito bem que o primeiro computador a ter sintetizador de voz foi o modelo IBM 704, construído em 1962, no centro de pesquisa Langley, em Urbana Illinois – ou você acha que eu iria esquecer isso? E a primeira música que ele cantou numa demonstração (advinha qual foi? com Certeza!) foi Daisy Bell, e Arthur Clarke estava lá pra ver e ouvir isso – pronto, matei a charada.
Uma coisa que só se percebe no inglês é o uso recorrente por HAL do termo “I'm afraid” (estou com medo). Num uso ultra polido, este termo é entendido como “Receio que”, pra negar alguma coisa a alguém polidamente (“I'm afraid I can't do that" – “Receio que não possa fazer isso”). Mas, ao ser desativado, HAL usa esse termo indicando medo, de fato. E Kubrick pareceu querer reforçar isso pelo uso sistemático desse termo, inclusive por David, quando cogitam desliga-lo. Foi por medo de comprometer a missão que HAL matou a tripulação? Teria sido por medo de admitir sua própria falha que a máquina escondeu que errou ao informar o defeito? Não foi por medo que os astronautas quiseram desligar HAL? Enfim, esse é apenas mais um nível em que o filme pode ser analisado.

JÚPITER E ALÉM
       
Mais uma vez os corpos celestes se alinham. E mais uma vez a lembrança do símbolo do Deus cornífero. Essa é a parte mais louca e incompreensível do filme, em que David deixa a Discovery em uma cápsula e embarca rumo a uma viagem intergaláctica até sabe-se lá onde! Os comentários mais interessantes são os de que as imagens surreais que inundam a tela fazem referência (num nível subconsciente) a criação da vida no útero – tá, eu sei que foram longe. Se formos analisar Freud, a nave Discovery (um grande falo) ejeta pela "cabeça" a cápsula de uma forma diferente das demais, como se tivesse cuspindo-a (ou ejaculando-a, ah, você entendeu). Entra-se então por uma fenda vertical (sim) e, dentre as várias imagens fluidas que também lembram galáxias sendo criadas, há pelo menos duas que não precisam de muita imaginação para possíveis interpretações. Ao fim da sucessão de imagens aquosas e orgânicas, aparecem 7 objetos lapidados em forma de Octaedros (um dos sólidos platônicos relacionados ao ar). Seriam estas naves extraterrestres, escoltando David através de um portal? Seja como for, elas encerram a parte da viagem através das luzes. A viagem continua por uma superfície rochosa, entrecortada por rios e mares, até que David chega a uma sala totalmente decorada com mobília da era da renascença (renascimento de novo!) e quadros com cenas bucólicas da natureza. Apenas o chão retro iluminado (semelhante ao teto da estação espacial) alude a uma época futurista. Em cenas que alternam pontos de vista, David vê a si mesmo como outra pessoa, progressivamente mais velho. Pode-se interpretar essa sequência no quarto como uma desintoxicação da dependência das máquinas, uma vez que ele se desfaz da roupa de astronauta; e poder-se-ia inclusive retomar a ideia do capacete verde, visto que a mesa é verde (ora bolas!), e, na cena do leito de morte, aparece um largo espaldar verde circundando a área da cabeça de David. Quando ele quebra a taça de vinho é que atinge um nível de consciência mais elevado. Na tradição judaica, quebra-se um cálice ao fim da cerimônia de casamento. Há vários significados, mas um deles é que isso simboliza uma nova vida, um mudança de forma para todo o sempre, ou seja, e dois indivíduos passam a ser um casal.

Da cama, David vê o monolito, e faz um gesto de tocá-lo que lembra muito a pintura "A Criação de Adão", que o mestre renascentista (renascimento) Michelangelo fez no teto da Capela Sistina – você sabe onde fica. David transforma-se então num feto, com um brilho no olhar (torna-se um iluminado?). A câmera se aproxima do monolito, como se fôssemos transportados do local para a escuridão do espaço, de onde o feto (já leu algo sobre “Starchild”, aquela história da carochinha sobre crianças de outros planetas?) contempla o planeta Terra do alto, para depois mirar bem dentro de nossos olhos com um olhar perturbador que mescla sabedoria/velhice e inocência/infância, o que me remete a ideia que os seres humanos sempre irão influenciar de um jeito ou de outro, as gerações seguintes.

Kubrick não quis limitar o escopo de seu filme.

"Como poderíamos apreciar a Mona Lisa se Leonardo da Vinci tivesse escrito embaixo do quadro: ‘A mulher está sorrindo porque ela esconde um segredo do seu amado'. Isso iria acorrentar o espectador à realidade, e eu não quero que isso aconteça com 2001. Eu trabalhei de forma que nada importante é dito nos diálogos, e que qualquer coisa importante no filme seja traduzida em termos de ação. Um roteiro é a forma de escrita menos comunicativa já feita”
Stanley Kubrick

Mas quem expressou melhor a relação com o filme foi o ator Keir Dullea, que interpretou o David Bowman.

"Se você vê um quadro de Picasso, é importante saber o que Picasso queria ou é mais importante sua relação com ele, sua reação emocional a ele?"
David Bowman

Não é lindo? Pode ser até mais um “nada a ver”, mas olha que faz um sentindo... daqueles que aguça todos os outros, viu? Que é complicado de se assistir e de se entender (só nas duas primeiras vezes certo?) é, mas... depois da primeira tentativa tudo se resolve. Interessante quando assisti a esse filme pela primeira vez: 01 de janeiro de 2000, em plena madrugada; todo mundo dizia: “Ah, o mundo vai acabar”, “Será o fim da humanidade”, só porque era transição milenar. A humanidade não tem fim. O fim não conhece o fim, e se conhece, creio que nem mesmo o próprio venha a lembrar-se. O mesmo se dá com o início. Esse filme é um espetáculo, talvez de uma futura realidade, não muito distante da nossa. É um filme revolucionário. Afinal de contas, você está acessando esse registro virtual através de que máquina? Seria ela um IBM Sequoia... ou Tablet Phone? Ah, você não está na terra? Tá certo. Você não sente nada ao ouvir o prelúdio e encerramento do filme?



2001: A Space Odissey, EUA, 1968, 142 min. Colorido. Distribuido pela Warner Bros.
Com Keir Dullea, Gary Lockwood, William Sylvester, Douglas Rain.
Escrito, Produzido e Dirigido por Stanley Kubrick.
Orçamento: U$$ 10,5 milhões. Receita nos EUA: U$$ 56,71 milhões.


Por Dandan Gouveia, da série “um pouco de Kubrick”. Aguardem pelos próximos.